quarta-feira, 29 de maio de 2013

Porque somos mães... e filhas


Assim que nasceu a mãe que habita em mim, passei a devorar livros sobre o tema. O primeiro eu ganhei quando a ficha sequer tinha caído. A maternidade não passava de uma concentração de hormônio num exame de sangue. Era a “Enciclopédia Larousse da Gravidez”, com fotos intrauterinas, lindas e hiper-realistas, que tornavam aquela descoberta ainda mais inacreditável.


Depois veio “O que esperar quando você está esperando”, o best-seller de ArleneEisenberg, S. E. Hathaway, Heidi Murkoffque virou filme com Rodrigo Santoro e J. Lo. Foram quase 1,6 mil páginas, considerando que ele me acompanhou (ou eu o acompanhei) por duas gravidezes. 


Li ainda “Ioga para gestantes” e “A doula no parto”, da Fadynha, e o interessantíssimo “A cesariana”, do obstetra francês Michel Odent. Defensor do parto natural, ele escreveu um longo ensaio com um quê antropológico para compreender a prevalência das cirurgias em certas culturas, como ocorre no Brasil. 


Folheie muitos outros, abandonei uns tantos pelo caminho. Mas nenhum deles me pegou tão de jeito quanto “A relação mãe e filha”, da psicanalista Malvine Zalcberg. Li, reli e volto a ele de vez em quando. 

Seguramente, qualquer estudante de psicologia principiante deve fazer uma leitura mais refinada do que a minha. Mas a autora é generosa com os leitores. Suas referências buscam situar mesmo aqueles que tiveram um contato superficial com Freud, Lacan,Winnicott, Melanie Klein. Mencionando casos clínicos, o que torna tudo mais compreensível para quem não faz parte das rodas psicanalíticas, ela descontroi e reconstroi essa relação tão delicada. 


De tantas lições, divido duas que me pareceram mais claras e definidoras desse lugar que ocupamos. Ela rechaça a ideia tão comum em nossa sociedade de que um filho completa a mulher ou, melhor dizendo, de que a maternidade é o que nos torna mulheres de fato. É o justo oposto, ela dirá: “Só a mãe que tiver encontrado seu lugar como mulher, prestando-se aos jogos da mascarada e criando-se uma identificação feminina, estará em condições de, além de amar a filha – ‘o amor não é suficiente’, diz Betthelheim –, abrir-lhe o caminho para a criação de uma identidade feminina para si própria. É como e com a mãe que a menina constitui subjetivamente sua feminilidade. (...) A mãe, conciliada com sua condição feminina, aceitará sua filha com um olhar pleno de encorajamento e compensação.” (p. 187, grifos da autora). 

A segunda proposição, me parece, é oportuna para os tempos em que vivemos, quando as avós ocupam um papel importante no cuidado das crianças. Citando Winnicott, que afirma que “para toda mulher, há sempre três mulheres: ela menina, sua mãe e a mãe da mãe”, ela observa que uma mãe-filha “muitas vezes não hesita em oferecer seus filhos à mãe para assegurar de continuar tendo posição importante na vida desta” (p.175). Naturalmente, ela não se opõe à convivência afetuosa entre as avós e suas netas, mas questiona os reais motivos por trás dessa convivência.

O livro trata de muitas outras questões, inclusive daquelas que envolvem o masculino, os meninos, o pai... 

Enfim, são temas para nossa reflexão, nós que somos mães ou filhas.

Por Tatiana Clébicar - colaboradora da Petit Polá no Rio de Janeiro

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